quarta-feira, 7 de novembro de 2018

Caso clínico: toxoplasmose congênita e sepse neonatal

Caso clínico


*Caso fictício, para todos os fins

05 de novembro de 2018
19h - Hospital, leito comum

Anamnese
Identificação
RN L.S., do sexo masculino, 7 dias de vida. Nascido a termo, com 39 semanas e 1 dia de idade gestacional.

Filho da mãe R.S., 18 anos, sem profissão, G2Pn1Pc1A0.

Queixa principal (mãe): “infecção na bolsa”.

HDA
Mãe relata que há oito dias iniciou trabalho de parto em ambiente hospitalar. Refere que permaneceu por mais de 12 horas com bolsa rota, de líquido amniótico claro. Relata ainda que foi realizada antibioticoterapia durante o trabalho de parto. Seu RN nasceu de parto via vaginal, sem intercorrências, há sete dias.

Mãe refere que, após o nascimento, foi realizado um hemograma em seu RN. O exame constatou uma infecção (sic). Refere que, por isso, a equipe médica iniciou antibioticoterapia e manteve a internação hospitalar, com previsão de alta para amanhã (sic). 

Mãe refere que RN mantém-se assintomático desde o nascimento, calmo, com boa sucção, hábito intestinal normal, e diurese presente.

Antecedentes fisiológicos
Pré natal: mãe do RN refere exame indeterminado para toxoplasmose na 23ª semana de gestação (2º trimestre – IgG negativo e IgM indeterminado; 3º trimestre – avidez indeterminada + IgG negativa e IgM indeterminada). Refere que foi encaminhada para o PNAR, onde fez uso de espiramicina por uma semana (recebeu alta medicamentosa). Nega ter realizado tratamento com antibióticos durante o período pré-natal.

História patológica pregressa 
Medicamentos em uso: RN em uso de gentamicina (14 mg 24/24hrs) e ampicilina (360 mg 12/12hrs), sulfadiazina, pirimetamina e ácido folínico.

Exame físico
Inspeção geral: BEG, corado, anictérico (?), acianótico, hidratado, afebril.
Fontanela anterior e posterior normotensas.
Membros: Ortolani negativo.
Face: Implantação normal de orelhas. Olhos sem pregas epicânticas.
Neurológico: preensão palmar presente, Moro presente, Babinski presente.
Cardiovascular: bulhas normofonéticas, rítmicas, em 2 tempos. Estimativa da FC dificultada por conta da presença de soluços.
Respiratório: murmúrios vesiculares presentes, sem ruídos adventícios. Soluços.
Abdominal: abdômen inocente, sem visceromegalias, normotenso, ruídos hidroaéreos presentes.

Exames complementares
30/10 - leucócitos 17.500, referência de até 21.000
03/11 - discreta anemia
03/11 - "triagem infecciosa alterada” (PCR 6.300, VR de 0 – 5 [?]): risco para toxo (segundo anotação em prontuário). Teste do olhinho, do coraçãozinho e da orelhinha normais.
Aguarda TC de crânio.

Comentários: sepse neonatal
Sepse neonatal é uma síndrome clínica em que um recém-nascido, frente a uma bacteremia, desenvolve uma resposta inflamatória sistêmica. É dita precoce quando surge antes das 72 horas de vida e tardia, se após. Essa condição tem alta morbimortalidade, justificando o uso de antibioticoterapia precoce.

A forma precoce - que se relaciona a esse estudo de caso - tem sinais mínimos e inespecíficos. Ela tem a ver com fatores pré-natais e do periparto. As bactérias que causam esse quadro no recém-nascido, mais frequentemente, são aquelas presentes no trato genital feminino, como Streptococcus agalactiae, E. coli e Listeria monocitogenes. 

Diagnóstico e suspeita
Desse modo, a tríade para diagnóstico envolve a clínica - como dita, muitas vezes pouco exuberante - do RN, relacionadas à suspeita, devido a presença de fatores de risco maternos e neonatais, além de investigação por meio de exames laboratoriais. 

Quanto à clínica, dispneia, taquicardia ou bradicardia, distensão abdominal, icterícia, déficit de perfusão, hipotonia e letargia podem ocorrer. No caso clínico em questão, o RN não tinha nenhuma dessas manifestações - e a mãe nega qualquer sintoma significativo anterior.

Os fatores de risco relacionados ao pré-natal e ao periparto estão abaixo:

Do Guia de Bolso de Neonatologia da FMUSP

Desses, apenas a bolsa rota prolongada pode ser identificada como risco em nosso caso. A mãe refere que permaneceu por mais de 12 horas com bolsa rota (referiu ainda que o líquido era claro). Não é claro se esse tempo foi maior que 18 horas. Foi realizada antibioticoterapia durante o trabalho de parto - uma medida profilática contraa sepse neonatal.

Entre os exames laboratoriais, além da hemocultura, um deles é o hemograma. A mãe referiu que havia sido informada de que o RN tinha uma "infecção" porque algum dos parâmetros do hemograma "estava em 17" (sic). Em prontuário, registrou-se que, logo após nascer, o RN tinha 17.500 leucócitos/mm³ - ainda insuficiente para considerar leucocitose.

No entanto, no dia 03/11, aos cinco dias de vida, o RN tinha uma PCR (proteína C-reativa) de 6.300 [6.3?]. A elevação foi atribuída como "risco para toxo" - mas esse marcador não costuma estar elevado na toxoplasmose [fonte]. No entanto, a PCR é um marcador inflamatório útil para diagnosticar infecção ou sepse neonatal, especialmente quando feita de forma seriada.

Tratamento
A decisão clínica diante desse quadro - apesar da aparente ausência de manifestação clínica do RN, até ao melhor do meu conhecimento, apesar de hemograma sem leucocitose e apesar de profilaxia adequada - foi a de realizar um esquema empírico para tratamento de sepse precoce. É possível que um exame de PCR anterior estivesse alterado, fundamentando a decisão.

Do Guia de Bolso de Neonatologia da USP

Assim, optaram pelo uso de ampicilina e gentamicina durante 7 dias. Esse esquema, de fato, é preconizado pela Sociedade de Pediatria do Rio Grande do Sul, considerando os microrganismos mais encontrados na sepse neonatal precoce e a sensibilidade destes.

Enquanto a ampicilina, um beta-lactâmico, tem ação contra gram-positivos, a gentamicina, um aminoglicosídeo, atua contra bactérias gram-positivas e gram-negativas. No entanto, esse esquema pode provocar enterocolite necrosante - e, portanto, o tempo de tratamento deveria considerar se há  hemocultura positiva e a sua evolução clínica.

Comentários: toxoplasmose congênita
Toxoplasma gondii
A toxoplasmose é uma zoonose, transmitida por meio da ingestão de oocistos (em água e alimentos contaminados) do Toxoplasma gondii. Esses oocistos estão presentes nas fezes dos felinos. Por isso, pede-se às gestantes que não manipulem Também é possível a contaminação pela ingestão de cistos presentes em carnes cruas ou mal passadas.

Toxoplasmose na gestação
A grande preocupação em termos de saúde pública é uma primoinfecção pelo protozoário durante a gestação. Na fase aguda de infecção, os parasitos podem provocar a infecção do feto devido à chance de transmissão via placentária. Quanto mais precoce for a infecção materna, menores as chances de transmissão vertical, mas maiores as de acometimento grave do feto - incluindo óbito fetal e neonatal.

Como a infecção é quase sempre assintomática, solicitam-se as sorologias para a toxoplasmose durante o pré-natal. Isso é feito no primeiro trimestre e nos trimestres seguintes caso a gestante seja suscetível à toxoplasmose (ou seja, tenha anticorpos IgG e IgM anti T-gondii negativos). 

No caso clínico em exemplo, a gestante teve um exame com resultado de anticorpos IgM indeterminado e IgG negativo. Em um estudo epidemiológico realizado com 2343 voluntários em Anápolis, mostrou-se rara a situação de sorologia indeterminada para toxoplasmose [1].  
Protocolo SMS de Ribeirão Preto

Nesses casos, em gestantes, é recomendada a repetição da sorologia. Caso IgM permaneça indeterminado, sem soroconversão de IgG, deve-se considerar a gestante "suscetível" [2]. Há a possibilidade de IgM falsamente positivo em soros contendo anticorpos antinucleares ou fator reumatoide [3, 4].

Desse modo, a prescrição de esquema tríplice anti-toxoplasmose para o RN - feita nesse caso específico - não parece justificada com base nos dados disponíveis no prontuário. Não houve confirmação de infecção materna, nem de infecção fetal durante o período pré-natal.

Conduta profilática e terapêutica na gestação
Também frente ao resultado indeterminado de IgM para toxoplasmose, a prescrição de espiramicina (macrolídeo que previne a infecção placentária pelo T. gondii)), feita nesse caso, parece ter pouca validação técnica.

A droga é empregada em casos de infecção materna aguda - IgM positivo e IgG negativo; ou recente -  IgM e IgG positivos com baixa avidez de IgG. Na confirmação da infecção fetal (via PCR do líquido amniótico), inicia-se o esquema tríplice anti-toxoplasmose.

Infecção congênita: manifestações clínicas

No recém-nascido, a infecção pelo T. gondii pode ser desde assintomática a manifestação com uma miríade de apresentações clínicas. Destacam-se as alterações no sistema retículo-endotelial, levando a hepatoesplenomegalia. Também há um acometimento do sistema nervoso central - podendo causar hidrocefalia, calcificações cerebrais, encefalite e crises convulsivas.

Também é clássico o acometimento da retina e da coroide, levando a um quadro inflamatório que pode culminar em lesões irreversíveis com perda da visão. Isso pode se instalar não só no período neonatal, mas também ao longo da adolescência ou da vida adulta do paciente como toxoplasmose congênita.

Diagnóstico
Daí a importância do diagnóstico do recém-nascido com infecção suspeita - para que se institua o tratamento rapidamente. A investigação do recém-nascido é ampla: destaca-se a procura de anticorpos IgG, IgM e IgA contra o protozoário (a persistência de IgM após o quinto dia de vida comprova o diagnóstico). PCR no sangue e/ou líquor também são possíveis.

Outros exames importantes incluem o raio-X de crânio, a ultrassonografia transfontanela, a TC de crânio e a fundoscopia, que podem revelar alterações neurológicas e oftalmológicas típicas da infecção pelo protozoário. Hemograma e função hepática também ajudam a direcionar o diagnóstico.  Nesse caso específico, uma investigação exaustiva para toxoplasmose não parece justificada -  pois não havia suspeita de infecção material, de fato.

Tratamento
O tratamento do RN com toxoplasmose congênita (confirmados no momento pré-natal ou ao nascer) é feito com o esquema tríplice: sulfadiazina + pirimetamina + ácido folínico. Em casos de coriorretinite ativa, emprega-se prednisona. Esse tratamento tem duração de 1 ano - e também é empregado nos casos de suspeitas de toxoplasmose congênita, em que não é possível excluir a possibilidade de infecção.



terça-feira, 6 de novembro de 2018

Diarreia aguda em Pediatria: diagnóstico e tratamento



Hoje, morre-se menos por diarreia
Cerca de 30% dos óbitos preveníveis que ocorrem antes dos 5 anos de idade se devem à diarreia e à pneumonia. Felizmente, observa-se uma redução na mortalidade por diarreia e desidratação no Brasil nas últimas décadas. 

Por exemplo, em 1980, a diarreia ocupava o segundo lugar como causa de mortalidade infantil e representava 24,3% dos óbitos. Em 2005, passou a ocupar o quarto lugar, como causa de 4,1% dos óbitos. 

Atribuem-se como motivos dessa queda a melhoria das condições de saneamento da população e a divulgação de protocolos (como da OMS e do MS do Brasil) consolidando os pilares do tratamento da diarreia - terapia de reidratação e cuidados com a alimentação. Outras medidas, como recomendação de uso de zinco via oral e a inclusão da vacina contra o rotavírus no calendário de vacinação do Brasil também ajudaram a melhorar esses indicadores de mortalidade.

Definição
A diminuição da consistência das fezes é o principal parâmetro para considerar diarreia. Por definição, trata-se da ocorrência de três ou mais evacuações com fezes líquidas ou amolecidas nas últimas 24 horas. Tem início abrupto e causa presumivelmente infecciosa (por vírus, bactérias ou protozoários).

Em sua fisiopatologia, as diarreias agudas ocorrem por um desequilíbrio entre absorção e secreção de líquidos e eletrólitos - havendo grande perda desses. São quadros autolimitados, que se resolvem geralmente em uma semana.

Definem-se as diarreias desse modo:
  1. Diarreia aguda aquosa: pode durar até 14 dias e provocar desidratação e desnutrição energético-proteica, sem tratamento adequado.
  2. Diarreia aguda com sangue (disenteria): fezes sanguinolentas indicam lesão da mucosa intestinal. Pode estar associado com infecções sistêmicas e desidratação. Os principais agentes etiológicos são bactérias do gênero Shigella.
  3. Diarreia persistente: quando a diarreia aguda se estende por 14 dias ou mais. Pode provocar desidratação e desnutrição - portanto, sendo associada com elevada letalidade.
Avaliação clínica
A história clínica e o exame físico são fundamentais para traçar o plano terapêutico mais adequado. Os achados do exame clínico estão absolutamente vinculados à conduta a ser adotada. 

Anamnese
Na anamnese, deve-se questionar a duração da diarreia, a consistência das fezes, a presença de sangue nas fezes, a frequência de evacuações (número de episódios diarreicos). Idade menor que 2 meses e mais que oito episódios diarreicos volumosos em 24 horas traduzem gravidade e maior risco de complicações. Também deve-se questionar se há febre ou vômitos associados. 

Também deve-se questionar sobre os hábitos alimentares da criança e sobre casos prévios de diarreia. Ainda, as vacinas e o uso de medicamentos devem ser investigados. 

Por fim, questionar se há diurese presente (para estimar desidratação) e o peso recente, se conhecido (também para determinar a desidratação).

Exame físico
É fundamental mensurar o peso na consulta inicial - para permitir o acompanhamento e avaliação da evolução do paciente. Perda de 5% do peso traduz desidratação leve, entre 5 a 10%, desidratação moderada e acima de 10% desidratação grave.

Essa classificação proporciona uma estimativa do volume necessário para correção do déficit corporal de fluído em consequência da doença diarreica: perda de 5%, ou seja, 50 mL/Kg; de 5 a 10%, ou seja, 50 a 100 mL/Kg e mais do que 10%, ou seja, mais de 100 mL/Kg.

Além do estado nutricional, utilizam-se outros dados clínicos para inferir desidratação, como presença de sinal de prega cutânea, ausência de lágrimas nos olhos, saliva espessa, diurese diminuída, sede, pulso débil, taquicardia, taquipneia, tempo de enchimento capilar, nível de consciência, entre outros.

Quadro protocolar para avaliação, diagnóstico e conduta

Tratamento
Como visto, o grau de desidratação determina o tratamento mais adequado: plano A para paciente com diarreia, mas desidratado; plano B para paciente com diarreia e algum grau de desidratação; plano C para paciente com diarreia e gravemente desidratado. A reavaliação pediátrica deverá ser contínua.

Plano A
Tratamento no domicílio, com orientação ao responsável para manter a alimentação habitual e também aumentar a oferta de líquidos (exceto café e bebidas processadas) e de solução de reidratação oral (SRO), especialmente após a evacuação. 

Também deve-se orientar aos pais para que possam reconhecer sinais de desidratação (como piora das evacuações e/ou vômitos, sede, diminuição da diurese) e, na presença deles, buscar novamente o serviço de saúde. Também orienta-se sobre medidas de higiene na preparação de alimentos e prescreve-se zinco uma vez ao dia, durante 10 a 14 dias.


Plano B
Realizado na unidade de saúde. Deve-se administrar a solução de reidratação oral (entre 50 a 100 mL/kg), durante 2 a 4 horas, após cada evacuação. A administração deve ser feita aos poucos, em pequenas quantidades, com copo ou colher. Nessa fase, devem ficar em aleitamento materno e com suspensão de outros alimentos. Deve-se iniciar suplementação de zinco.

Os pacientes devem permanecer até a reidratação completa e reintrodução da alimentação, na própria unidade. A partir daí, segue-se para o plano A. Se a desidratação evolui pra grave ou as dejeções aumentam, consideram que a terapia falhou. Então, segue-se para o plano C.


Plano C
Em casos de desidratação grave (como perda de peso maior que 10% ou falha na TRO), a correção é feita com terapia de reidratação via parenteral (reparação ou expansão). A quantidade e velocidade de infusão dependerá do peso do paciente e das perdas por evacuações. O paciente deve permanecer com reidratação venosa até que tenha condições de tolerar a alimentação e de receber líquidos via oral.

Deve-se conseguir um acesso venoso calibroso (em alguns casos, dois, como no choque hipovolêmico) para a reidratação venosa. O plano de reidratação conforme o Ministério da Saúde é:

A evolução clínica é boa quando há recuperação do peso perdido, voltando-se ao esperado para idade; redução das perdas diarreicas; e desaparecimento de sinais de desidratação (como por exemplo diurese abundante).

Cuidados com a alimentação
Além da reidratação, a manutenção da alimentação é outro pilar do tratamento da diarreia aguda. É consenso que o aleitamento materno deve ser mantido durante a diarreia. A suspensão da alimentação só ocorre durante as etapas de reidratação na desidratação vigente.

A alimentação deve ser feita conforme o hábito do paciente - sendo oportuno corrigir erros alimentares. Não há recomendação de diluição de fórmulas lácteas ou uso de fórmulas sem lactose em pacientes tratados ambulatorialmente. Em pacientes hospitalizados, fórmulas sem lactose são apropriadas.

Deve-se tomar cuidado para que sejam atendidas as necessidades energéticas da criança. Pacientes hospitalizados com diarreia persistente devem receber, conforme a OMS, 110 kcal/kg/dia. As quantidades de micronutrientes deve ser também adequada. Dieta isenta de leite pode ser empregada somente em casos selecionados de diarreia persistente.


segunda-feira, 5 de novembro de 2018

Pneumonias agudas em Pediatria

A relevância das pneumonias agudas na criança é impossível de ser ignorada - basta ver que, conforme a OMS, elas são responsáveis por 20% da mortalidade infantil em crianças menores de 5 anos de idade. São 2 milhões de óbitos por ano - 70%, em países subdesenvolvidos como o Brasil. Diante dessa epidemiologia, um diagnóstico preciso e ágil revela-se imperioso.


A principal etiologia das pneumonias adquiridas na comunidade (PAC) é pneumocócica: causada pelo Streptococcus pneumoniae, espécie de bactéria Gram-positiva (foto acima). Tem observado-se aumento de cepas dessa bactéria resistentes à penicilina, o que pode interferir na terapêutica. 

Também mais recentemente, graças à cobertura vacinal, houve menor proporção de casos causados pelo Streptococcus pneumoniae e outros agentes. Isso deve-se, por exemplo, à indicação de rotina da vacina contra Haemophilus influenzae tipo B (aos 2a5m) e a pneumocócica 10 conjugada (aos 2, 4 e 6 meses de idade, com reforço aos 12 meses).

Nas pneumonias adquiridas nas comunidade, outros importante agentes etiológicos são: Mycoplasma pneumoniaeChlamydophyla pneumoniae. Já nas pneumonias intra-hospitalares, destacam-se Staphylococcus aureus e as enterobactérias - elas podem infectar pacientes imunodeprimidos ou aqueles que estejam recebendo ventilação mecânica.


Em lactentes, outro agente causal possível é o vírus sincicial respiratório, podendo determinar quadros mais graves. Esse é um entre muitos outros vírus que podem causar bronquiolite e pneumonia. De todo modo, a identificação etiológica precisa é relativamente difícil com a tecnologia habitualmente empregada na rotina. Métodos como a reação em cadeia da polimerase (PCR) mostram-se necessários para maior sensibilidade e rapidez nessa identificação.

O manejo adequado das pneumonias agudas em crianças envolve identificar a necessidade ou não de internação; e, finalmente, a instituição de uma terapêutica antimicrobiana empírica adequada.

Quando internar?
São exemplos de critérios de internação, diante de paciente pediátrico com quadro clínico de pneumonia:
  • Idade inferior a 2 meses; 
  • Toxemia ou quadro séptico; 
  • Hipoxemia que requer administração de oxigênio suplementar; 
  • Insuficiência respiratória aguda;
  • Incapacidade de tolerar medicação via oral; 
  • Fatores sociais que impossibilitem a reavaliação, caso ocorra piora clínica; 
  • Pacientes com alguma doença de base que possa alterar a evolução clínica da pneumonia (anemia falciforme, síndrome nefrótica, imunodeficiências congênitas ou adquiridas); 
  • Presença de complicações (derrame pleural, abscesso pulmonar, pneumatoceles, cavitações, pneumotórax)
Com qual antibiótico tratar?
Antes de tudo, deve-se coletar material biológico (como sangue ou secreções) para, via exames microbiológicos, determinar o agente etiológico e confirmar ou readequar a terapêutica. A escolha de antibiótico é puramente empírica - mas levando em conta aspectos epidemiológicos, por exemplo.
Neonatos
Geralmente, quando associado à corioamnionite, a infecção é por enterobactérias gram-negativas ou Streptococcus agalactieae. Recomenda-se tratamento com betalactâmicos (por exemplo, ampicilina associada com uma cefalosporina de terceira geração como cefotaxima) por 10 dias. Em infecções por bactérias gram-negativas, por até 21 dias.
 Lactentes jovens
Nesse grupo, é o pneumococo o agente etiológico mais provável, seguido por Staphylococcus aureus, Moraxella catarrhalis e Haemophilus influenzae não tipável. Causas virais, como vírus sincicial respiratório, são possíveis. Também infecção por Chlamydia trachomatis e Ureaplasma urealyticum podem levar a um quadro afebril ou subfebril.  
A diferenciação na prática clínica entre etiologias virais e bacterianas mostra-se difícil. Em geral, porém, etiologias virias causam febre < 38.5 graus, com hiperinsuflação pulmonar na radiografia; e etiologias bacterianas causam febre > 38.5 graus, com sinais de consolidação (substituição de ar alveolar por líquido [pus]) na radiografia.
Se não há sinais de toxemia, desconforto respiratório ou hipoxemia, recomenda-se tratamento ambulatorial com supervisão rigorosa, com amoxicilina por 7 a 10 dias. Havendo indicação de internação, o tratamento inicial é a ampicilina EV. Se não houver melhora clínica em 48 a 72 horas, a etiologia pode ser de bactérias gram-negativas ou resistentes aos beta-lactâmicos, podendo-se prescrever amoxicilina-clavulanato, cefuroxima ou ceftriaxona.
Pré-escolares
O pneumococo é, de novo, o agente mais provável nesse grupo. Assim, o tratamento ambulatorial inicial será feito como amoxicilina via oral. Caso não haja melhora em 48 a 72 horas, pode-se pensar em Moraxella catarrhalis e Haemophilus influenzae ou pneumococos resistentes à penicilina. Sugere-se a associação, assim, de amoxicilina com clavulanato ou uso de cefuroxima (cefalosporina de segunda geração).
 Mycoplasma pneumoniae e Chlamydophila pneumoniae correspondem a um terço dos casos nessa faixa. Na presença de quadros clínicos insidiosos, não responsivos à amoxicilina, deve-se usar claritromicina ou azitromicina (macrolídeos), visando esses agentes etiológicos.
Já nos pacientes que tem critérios para a internação, com pneumonia lobar, o tratamento é EV com ampicilina ou penicilina cristalina. Se não há melhora clínica, e a criança está toxemiada, podem receber amoxicilina-clavulanato ou cefuroxima ou ceftriaxona por via intravenosa.
Escolares e adolescentes
Pneumococos são os agentes mais prevalentes - justificando o emprego de amoxicilina. Porém, Mycoplasma pneumoniae Chlamydophila pneumoniae tem frequência cada vez mais importante - e, em sua suspeita, empregam-se macrolídeos (claritromicina ou azitromicina; levofloxacino > 12 anos).

Fonte:
Boletim da Sociedade de Pediatria de São Paulo