Texto escrito por Neil Majithia no Journal of Young Investigators
Tradução livre
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A cafeína é legalizada no mundo inteiro. |
Seja consumindo-a
numa xícara de café bem quente no café-da-manhã ou numa bebida energética depois
do almoço, o mundo é viciado em cafeína. De acordo com um estudo feito pela
revista New Scientist, 90% dos adultos da América do Norte tomam cafeína
diariamente, o que torna essa substância legal e psicotrópica a droga mais
utilizada no mundo. Seu uso muito difundido, adicionado à falta de qualquer
valor nutricional, deflagrou a reprovação daqueles que defendem dietas
rigorosas. Eles condenam a cafeína tal como se esta fosse um composto demoníaco.
Mas a partir de que ponto as visitas à cafeteria podem ser consideradas
atividades pecaminosas? Enquanto as pesquisas sobre a cafeína acabam mostrando
evidências conflituosas, o único consenso que se tem parece ser o antigo chavão
do "tudo em moderação".
A
cafeína é um composto químico naturalmente encontrado em sementes (café, cola),
folhas (chá mate) e frutas (cacau), além de outras mais de 60 plantas. No seu
ambiente natural, atua como um pesticida orgânico, pois protege as plantas de
insetos parasitas. Quando consumida por humanos, atua estimulando o sistema
nervoso central (SNC) e, assim, espanta a sensação de cansaço e promove a
acuidade mental. Os prazeres da cafeína, que é uma substância considerada legal
por governos de todo o mundo, é responsável pelo sucesso de produtos domésticos,
como o café, refrigerantes, bebidas energéticas e mesmo medicamentos.
Inibição competitiva: o modus
operandi da cafeína
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Por meio da inibição competitiva, a cafeína "engana" o cérebro |
Quando você sente
sono é por causa de moléculas chamadas de adenosina (trata-se de um nucleosídeo:
a adenina ligada a uma ribose) que
viajam pelo seu cérebro. A adenosina se liga a seus receptores proteicos específicos
na membrana dos neurônios. Isso desacelera a condução de impulsos nervosos e
induz a sonolência. A concentração de adenosina é mais alta no cérebro quando
você já gastou muita adenosina trifosfato, ATP, que é a forma de energia mais
usada pelas células. É a adenosina formada na quebra do ATP que faz com que você
se sinta cansado após trabalhar durante todo o dia ou correr longas distâncias.
Agora
vamos trazer a cafeína para a equação. A chave para entender o potencial
estimulante da cafeína está em sua estrutura química, que é muito similar a da
adenosina. Os compostos proteicos que flutuam na membrana plasmática dos neurônios
não conseguem diferenciar a cafeína da adenosina, de modo que a primeira consegue
se ligar a tais receptores.
No
jargão científico, esse processo é chamado de inibição competitiva, uma vez que
a cafeína compete com a adenosina pelos seus receptores proteicos. Para fins
didáticos, pode-se pensar neste fenômeno bioquímico como uma "dança da
cadeira" entre as moléculas, que competem pelos assentos presentes nos
neurônios. As leis da probabilidade garantem que quanto maior a razão cafeína/adenosina,
maior a quantidade de "cadeiras" que a cafeína irá ocupar – e maior o
impacto daquele expresso tomado ao fim do dia.
Mas
o que importa se a cafeína roubar algumas cadeiras da adenosina? É que a cafeína
é um antagonista da adenosina. Assim, quando a cafeína ocupa o sítio ativo de
receptores nos neurônios, ela não desacelerará os impulsos nervosos tal qual a
cafeína. Pelo contrário: irá fazer com que esses neurônios disparem seus
impulsos nervosos ainda mais rapidamente. Aí que entra a glândula pituitária
(hipófise), uma glândula endócrina situada na base do cérebro. Ela percebe que
os impulsos nervosos estão muito rápidos e faz a seguinte interpretação: o cérebro
está num estado de emergência. A fim de auxiliar o corpo a enfrentar quaisquer
perigos, a hipófise estimula o sistema nervoso simpático, causando a liberação
de epinefrina (mais conhecida como adrenalina). O sistema nervoso simpático é
responsável pelas respostas de "fuga ou luta". É o aparato que o
corpo usa quando precisa lidar com momentos de estresse: aumenta-se o ritmo
cardíaco, a glicogenólise hepática aumenta, o que eleva a disponibilidade de
glicose para que as células usem como fonte de energia. Esses são os efeitos
que rendem tantos fãs para a cafeína.
Um pouco de
senso comum nos dirá que simular continuamente um estado de emergência não pode
ser bom para a saúde. É isso que rende tantas críticas para a cafeína. No
entanto, como muitas vezes ocorre com tópicos ligados à saúde, apenas senso
comum não é suficiente para tirar conclusões definitivas.
Impacto da cafeína na
saúde
Quando usada em
moderação, os efeitos da cafeína são bem conhecidos por muitas pessoas. Em
menos de uma hora após o consumo, uma dose adequada irá causar um aumento no
estado de alerta e dará energia tanto para o trabalho mental quanto físico. O
uso contínuo de cafeína, no entanto, fará com que o indivíduo se torne mais
tolerante à substância e os efeitos citados anteriormente se tornarão menos
acentuados. A tolerância pode ser explicada pelo desenvolvimento de mais
receptores de adenosina no cérebro, a fim de se adaptar a presença frequente de
cafeína. Isso tornará o corpo mais sensível à adenosina, reduzindo os impactos
da administração da cafeína.
Mais
significante ainda são os efeitos experimentados quando não há cafeína alguma
no corpo. Mais adenosina irá se encaixar em mais receptores, o que irá aumentar
seus efeitos sedativos.
Por
exemplo, a adenosina naturalmente causa vasodilatação e, com isso, aumenta o
fluxo de sangue. Havendo aumento na densidade de receptores de adenosina, haverá
uma vasodilatação extrema, em especial das artérias que irrigam o cérebro. Isso
produzirá efeitos como dores de cabeça e náusea.
Como
a cafeína, reconhecidamente, estimula a produção de serotonina, um neurotransmissor
que regula o humor, raiva e agressividade. A queda acentuada de serotonina na abstinência
de cafeína irá causar efeitos indesejáveis como irritabilidade, ansiedade,
falta de concentração. Isso fará com que o usuário consuma mais cafeína para
aliviar tais efeitos, o que resolve o problema apenas temporariamente. Em casos
severos, esse ciclo vicioso pode levar o usuário à depressão.
A
maior parte dos consumidores de cafeína não experimenta esses problemas porque
seu consumo de cafeína não é alto o suficiente para causar complicações. Como
foi dito anteriormente, o uso moderado da cafeína é considerado seguro, e,
possivelmente, até mesmo um hábito saudável. Os dados são poucos e
inconclusivos, mas já há pesquisas que sugerem que a cafeína pode ajudar a
melhor a memória, afastar o mal de Parkinson, assim como reduzir o risco para
problemas cardíacos. O modo como a cafeína produz tais efeitos benéficos não é
bem compreendido ainda e, portanto, requer mais estudos.
O
moral de toda essa história é que o que ingerimos não pode ter unicamente
efeitos positivos ou unicamente efeitos negativos. A bioquímica corporal é
muito complexa, com conexões intrincadas que unem os mais diversos órgãos. A
engenhosidade do corpo humano explica porque tudo que consumimos tem efeitos
primários, secundários e mesmo terciários. Não é diferente com a cafeína. A
substância psicotrópico que mantém o mundo inteiro acordado pode ser desde um
remédio até um veneno: tudo depende de como é utilizada.
gostei muito do post, vai me ajudar muito no meu trabalho sobre a descafeinação do café.
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