Definição
A DPOC é uma patologia caracterizada por sintomas respiratórios e pela limitação do fluxo aéreo (que é medida pela espirometria) - ambos sendo persistentes e progressivos.
Em sua fisiopatologia (leia mais abaixo), estão envolvidos processos como a bronquiolite e a disfunção mucociliar - que leva ao estreitamento das pequenas vias aéreas, obstruída por muco - e lesões ao parênquima pulmonar, com prejuízos das superfícies de hematose (enfisema). Também, devido à destruição do parênquima, há a perda da adesão dos alvéolos às vias aéreas - o que determina prejuízos ainda maiores à troca gasosa.
Além de ter tratamento, a DPOC pode ser prevenida. As alterações patológicas acima são de origem inflamatória - promovidas pela interação entre fatores ambientais (exposição a partículas e gases nocivos, como os do cigarro) e fatores genéticos.
Epidemiologia e o fardo da doença
A DPOC ocupa o quinto lugar entre as principais causas de morte no Brasil - ela ocupa a liderança na mortalidade por doenças respiratórias. Seu fardo social e econômico também é grande, ao considerarmos a quantidade de internações por DPOC por ano e o absenteísmo no trabalho. A prevalência tende a aumentar - com a exposição cada vez maior aos fatores de risco, o envelhecimento populacional e a mortalidade reduzida por doenças infecciosas e cardiovasculares.
Apesar disso, a DPOC é prevenível com medidas como a cessação do tabagismo, como já foi pontuado. Por esse e outros motivos, o tabagismo é considerado um problema de saúde pública.
Pacientes com DPOC apresentam uma redução da capacidade de se exercitar, além de perderem a força dos músculos respiratórios. No tratamento, são empregados corticoides e broncodilatadores. Nas complicações infecciosas, antibióticos também são necessários. Em crises de agudização, oxigenioterapia e ventilação mecânica são usados - novamente, com grande impacto social e econômico.
Fatores que influenciam o desenvolvimento e a progressão da doença
A cessação do tabagismo pode evitar a instalação de DPOC e também melhorar a qualidade de vida dos portadores. É verdade que não-fumantes também podem ter DPOC - mas nesse caso a doença é mais branda, com menos sintomas e menor impacto na qualidade de vida.
Fatores genéticos estão envolvidos, também: por exemplo, menos de 50% dos fumantes desenvolvem DPOC, o que mostra que é necessária a interação entre fatores ambientais e genéticos. O gene mais associado ao DPOC é o da alfa-1 anti-tripsina (inibidor de protease, circulante no organismo). Ele está "defeituoso" nos pacientes com DPOC.
O status socioeconômico também é um fator de risco, pois interfere no desenvolvimento e maturação pulmonar. A exposição ocupacional à fumaça derivada da queima de combustíveis fósseis também é outro fator.
Patologia
A DPOC é uma doença marcada pela inflamação - tanto sistêmica quanto mais propriamente do aparelho respiratório. Células inflamatórias (como macrófagos, neutrófilos; e eosinófilos em pacientes asmáticos) aumentam em número no parênquima, na vasculatura pulmonar e nas vias aéreas.
Elas liberam mediadores inflamatórios, promovendo dano tecidual, que é constantemente reparado. A reparação contínua pode levar à fibrose tecidual. O estreitamento das vias aéreas por essa resposta inflamatória determinam uma redução do VEF1 (volume expiratório forçado em 1 segundo, avaliado na espirometria).
A resposta inflamatória é comum em resposta a irritantes como as partículas do cigarro, mas só que é mais intensa em pacientes com DPOC. Com isso, há estresse oxidativo local no aparelho respiratório, especialmente durante as crises (exacerbações).
Também ocorre um desequilíbrio na proporção de proteases/anti-proteases, favorecendo um acúmulo de proteínas que degradam tecido conjuntivo, contra as que inibem essa degradação. Essas proteínas chamadas proteases são derivadas de células inflamatórias e contribuem para a destruição do parênquima pulmonar. Isso contribui ainda mais para a limitação ao fluxo de ar e para a redução da hematose.
A limitação periférica persistente ao fluxo de ar (com exsudato e estreitamento de vias) leva a um "aprisionamento" de gases durante a expiração, levando a hiperinsuflação pulmonar. O aumento do volume pulmonar reduz a capacidade de exercício e causa sintomas como dispneia. Além disso, a hematose é prejudicada com a progressão da doença, podendo levar a hipoxemia e hipercapnia. Em geral, o prejuízo da hematose piora com o passar do tempo, com característica retenção de dióxido de carbono.
Em alguns pacientes, há uma proliferação de células caliciformes, devido à irritação crônica do epitélio por partículas tóxicas. Essas células, junto de glândulas da submucosa, aumentam sua atividade, levando à hiperssecreção de muco leva à tosse produtiva crônica. É a bronquite crônica.
As crises de DPOC podem ser promovidas por infecções respiratórias, seja de vírus ou bactérias, poluentes ambientais e outros fatores. Durante as exacerbações dos sintomas respiratórios, há cada vez mais hiperinsuflação pulmonar e aprisionamento de ar, com fluxo respiratório reduzido - causando dispneia.
Diagnóstico e avaliação inicial
DPOC é um diagnóstico que deve ser pensado em qualquer paciente com: dispneia, tosse crônica e produção de muco e/ou histórico de exposição a fatores de risco para a doença (tabaco, poluentes, exposição ocupacional).
Nesse cenário (sintomas e história sugestivas), a espirometria é necessária para a conclusão diagnóstica. DPOC é confirmado quando há uma VEF1/CVF <0.70 mesmo após uso do broncodilatador (obstrução persistente).
Sintomas
Dispneia: é o sintoma cardinal da DPOC, caracteristicamente crônica e persistente. Pacientes costumam descrever como necessidade de maior esforço para respirar.
Tosse: a tosse crônica é muitas vezes o primeiro sintoma. Pode ser intermitente no início, mais tarde se tornando persistente. Pode ser produtiva ou não.
Produção de muco: se ocorre por três meses ou mais em dois anos consecutivos, pelo menos, encaixa-se na definição clássica de bronquite crônica. Muco purulento reflete aumento de mediadores inflamatórios e pode indicar quadro de exacerbação bacteriana.
Sibilos e opressão torácica: sibilos inspiratórios e expiratórios podem estar presentes na ausculta. Opressão torácica muitas vezes ocorre depois de esforço físico e é uma sensação de origem muscular (fadiga da musculatura intercostal). Sua ausência não exclui diagnóstico de DPOC, nem sua presença indica diagnóstico de asma.
Outras: fadiga, perda de peso e anorexia são problemas comuns em pacientes com DPOC severo ou muito severo. Doenças consumptivas devem ser investigadas. Ansiedade e depressão também podem estar presentes, posto que a doença tem grande impacto funcional e na qualidade de vida.
História médica
Deve incluir:
- Exposição a fatores de risco - como tabaco e poluentes.
- História patológica pregressa - incluindo asma, rinite, sinusite, outras doenças crônicas - comorbidades que também causem restrição de atividade. Internações ou crises (agravamento de sintomas) prévios.
- História familiar de DPOC ou de outra doença respiratória
- Padrão dos sintomas: quando os sintomas começaram (geralmente, na vida adulta), evoluíram, sua intensidade, restrições sociais impostas pelos sintomas.
- Impacto da doença na qualidade de vida do paciente (trabalho, exercício físico, rotina familiar, atividade sexual...)
- Possibilidade de reduzir os fatores de risco
Exame físico
Raramente, leva a diagnóstico de DPOC. Os sintomas de limitação de fluxo de ar geralmente só se apresentam em quadros severos.
Espirometria
É a medida mais confiável de restrição ao fluxo de ar. A espirometria deve medir o volume de ar forçadamente expirado da inspiração máxima do paciente - a capacidade vital forçada, CVF e o volume de ar expirado no primeiro segundo dessa manobra - volume expirado forçado em 1 segundo, VEF1 e a razão dessas duas medidas (VEF1 / CVF). Os valores são comparados com aqueles esperados conforme a idade, sexo, altura e etnia do paciente.
O VEF1/CVF em pacientes com DPOC é menor que 0,7. Indica um padrão obstrutivo persistente, isto é, mesmo após teste com uso do broncodilatador.
Avaliação do paciente
Os objetivos, a fim de guiar a terapia, são avaliar o nível de limitação do fluxo de ar (pelos valores da espirometria), os impactos na saúde do paciente e o risco de eventos futuros (crises, internações ou óbito)
Classificação da intensidade de limitação do fluxo de ar:
- GOLD 1 - VEF 1 > 80% - leve
- GOLD 2 - VEF 1 entre 50 a 80% - moderada
- GOLD 3 - VEF 1 entre 30 e 50% - grave
- GOLD 4 - VEF 1 menor que 30% - muito grave
Classificação dos sintomas:
Há o COPD Assessment Test, que avalia com pontuações de 0 a 5 vários sintomas (como tosse, secreção de muco, qualidade do sono, níveis de energia, opressão torácica, atividades sociais e rotineiras, atividade física...).
Avaliação dos riscos de exacerbação:
Exacerbação é definida como uma piora aguda dos sintomas respiratórios que exige terapia adicional. São classificadas em: leve (necessitando de broncodilatador de curta duração [SABA]), moderada (tratada com SABA e antibióticos e/ou corticosteroides orais) e grave (que requer hospitalização ou visita à emergência). As exacerbações graves também podem levar à falência respiratória aguda.
O melhor preditor de exacerbações frequentes (definidas como duas ou mais num ano) é histórico desses eventos já tratados. A piora da função pulmonar também é associada com maior prevalência de exacerbação; e hospitalização é associada com pior prognóstico de DPOC.
Avaliação das comorbidades:
Muitas vezes, os pacientes com DPOC apresentam outras doenças crônicas. O próprio DPOC é associado a sintomas extrapulmonares importantes - como disfunção da musculatura esquelética, devido ao sedentarismo e a problemas nutricionais. Comorbidades incluem doenças cardiovasculares, síndrome metabólica, osteoporose, depressão, ansiedade e câncer de pulmão. As comorbidades devem ser tratadas independentemente.
Avaliação combinada do DPOC:
É feita em ABCD (que correspondem à: intensidade/impacto dos sintomas e risco de eventos futuros) e 1234 (que correspondem à classificação GOLD de limitação do fluxo de ar).
Por exemplo: paciente GOLD A - com VEF 1 > 80%, com 0 ou 1 exacerbação sem ida ao hospital. GOLD D - paciente com VEF 1 < 30%, com 2 ou mais exacerbações ou com ida ao hospital.